Tempo de Natal

28 de Novembro de 2018


Tempo de Natal 
Todo o mês de dezembro é perpassado pela espiritualidade pedagógica do Natal,  com a possibilidade de considerar diversos enforques. No contexto da espiritualidade litúrgica do Advento, vamos considerar a dimensão escatológica, — muito breve, neste ano — e a dimensão da espera natalina, nos dois últimos Domingos do Advento, igualmente breve, pois o 4º Domingo do Advento é celebrado em 23 de dezembro.
Quanto ao Natal, sugerimos uma pedagogia litúrgica que considere a espiritualidade natalina inspirada na dinâmica dos pastores, que ouvem a mensagem do nascimento de Jesus e se colocam a caminho para encontrar Jesus.
 
 
Esperar o fim dos tempos com esperança cristã
            A espiritualidade cristã nunca deixou de falar do final dos tempos, anunciando que tudo passará. Em algumas épocas históricas, tal dimensão foi colorida com tons apavorantes. A Teologia escatológica atual considera que o modo de esperar o final dos tempos tem como característica essencial o fato de ser cristã e, enquanto tal, ilumina-se na esperança cristã.
            Isto faz compreender que todas as manifestações de vida, mas particularmente da vida humana, estão nas mãos de Deus e, por isso, remetem à eternidade; um tempo que se vive no agora e não terá um fim. Estar nas mãos de Deus é admitir um início e um fim conduzido pela vontade divina. Disso a necessária atitude de viver de modo vigilante, ensina Jesus, para não se perder de vista o caminho proposto por Deus, que sempre é um caminho da promoção da vida.  
            A vigilância cristã, portanto, tem a ver com a geração da vida. Mesmo sendo conhecedores de que tudo passará e acabará um dia, o cristão vive de modo frutuoso; produzindo frutos nesta vida para serem colhidos e oferecidos a Deus, no altar da nova Jerusalém (Ap 21,2-4). A espiritualidade dos dois primeiros Domingos do Advento coloca-nos em vigilância para reconhecer e sempre recordar que não nascemos para a esterilidade, mas para gerar vida, promover vida, proteger a vida.
            — Como agir, então, diante de tantas ameaças contra a vida? A vigilância, neste caso, não se configura como inatividade produzida pelo medo, mas assume características de compromisso para regenerar a vida que se esconde até mesmo debaixo da catástrofe que tudo destrói. Isto por um fato muito simples: a esperança cristã, celebrada nos dois primeiros Domingos do Advento, ilumina-se na espiritualidade do amor, que produz vida. Onde o amor é cultivado, ali existe a possibilidade da regeneração, de um novo nascimento. Tudo terminará, exceto a vida humana regenerada no amor divino.
            Regenerar no amor é uma dinâmica conhecida de quem tem intimidade com Deus e adota atitudes como, por exemplo, retirar-se de contextos de pecado e buscar espaços para conviver com Deus. É a mensagem da profecia de João Batista convidando a caminhar num caminho novo que conduz ao encontro do Messias. João Batista fala de conversão, de abandonar caminhos estéreis para ingressar em caminhos regeneradores de vida.
A dinâmica de conversão, na maior parte das vezes, realiza-se no silêncio de quem se encontra com Deus; de quem faz experiência de Deus no deserto, como João Batista. A dinâmica da conversão, na prática, não faz publicidade com testemunhos de mudanças de vida, porque a mudança da vida, pela conversão, é um processo lento que acontece silenciosamente no coração da pessoa.
 
 
Origem da alegria cristã
            As celebrações do 3º e 4º Domingos do Advento anunciam a alegria cristã, cuja fonte encontra-se na fé confiante e tem em Maria o exemplo maior. Estamos falando daquela fé que não é simples crença, mas que tem a capacidade e as condições necessárias para perceber Deus presente e agindo na terra. Sendo Maria o ícone mais belo da fé confiante, é considerando o seu modo de viver que se pode compreender que a fé confiante não está na euforia provocada pela emoção, até mesmo pela emoção religiosa, mas no silêncio promotor da paz interior, da serenidade, da consolação divina.
            A via espiritual é aquela da espiritualidade mariana que, dentre outros atributos, considera a pequenez diante do Mistério divino. “O Senhor olhou para a pequenez de sua serva” (Lc 1,48), canta Maria no Magnificat. Pequenez é exercício da espiritualidade mariana que sinaliza para a vida humilde, vida vivenciada na simplicidade, vida que encontra o sentido de viver dedicando-se ao serviço. A pequenez foi o caminho escolhido por Deus para se encarnar, de onde a importância da pequenez no caminho da espritualidade.
            A visita de Maria à sua prima Isabel é um caminho da pequenez que se realiza no serviço e no cuidado de quem necessita de ajuda. A visita à Isabel, portanto, colega o sentido espiritual da pequenez com a atitude de ir ao encontro do outro para servir; para se colocar a serviço do outro. Este ir ao encontro do outro para servir realiza-se de modo culminante no Natal de Jesus Cristo: o próprio Deus que vem para servir pela regeneração da vida humana.
 
 
Hoje, Jesus nasceu para nós!
            O Nascimento de Jesus não é comemorado como um aniversário. A Liturgia não celebra datas comemorativas, mas o Mistério Pascal no nosso HOJE. Não, portanto, um aniversário, mas um “Memorial”, quer dizer, a atualização do Mistério do Nascimento de Jesus em nosso momento histórico. Aquilo que aconteceu no presépio, em Belém, não se repete como momento histórico, mas se atualiza como presença divina na celebração litúrgica do Natal de Jesus Cristo.
            Considerando tal realidade espiritual do Natal de Jesus Cristo, propomos viver a espiritualidade do Natal contemplando o exemplo dos pastores. Eles ouviram a mensagem do nascimento e se colocaram a caminho. É uma indicação da vida espiritual como caminho de busca, caminho de quem se empenha em buscar a luz divina no nosso hoje, neste nosso momento histórico. Celebrar o Natal como processo dinâmico, de quem ouve o anúncio e caminha na direção do Presépio.
 
 
Família, dom divino
A celebração da Sagrada Família destaca a família como fonte da vida, como fonte renovadora da vida. Nenhuma novidade, considerando que a família sempre foi fonte existencial e renovadora da vida e para a vida. Mas, no contexto espiritual do Natal, é importante considerar não somente a geração da vida humana, nos filhos e filhas, mas a família como fonte de um novo tempo para a sociedade. As mudanças sociais, às vésperas de um novo ano, precisam de um nascedouro onde a vida possa renascer mais fortalecida e este nascedouro está na família.
A proposta da Palavra, para que a família seja fonte geradora de um novo tempo, na Liturgia deste Ano C, considera a importância de consagrar os filhos e as filhas a Deus, isto é, educar os filhos e as filhas nos caminhos de Deus e nos valores do Evangelho. Nós cremos que o Evangelho pode renovar o mundo e esta renovação tem uma fonte: a família.
Serginho Valle
Novembro de 2018