Setembro 2012: O conhecimento de Deus

20 de Agosto de 2012


 O conhecimento de Deus conduz a relacionamentos fraternos

             O Mês da Bíblia introduz os celebrantes no caminho da pedagogia litúrgica tendo como pano de fundo o incentivo dos discípulos de Jesus a um cego: “Coragem, levanta-te, ele te chama” (Mc 10,49). O convite para se aproximar é resultado de sua insistente súplica à compaixão de Jesus, para que pudesse recuperar a vista e foi atendido. Jesus é o "photosforo", o “portador da luz” ou, o “doador da luz”. Na Palavra de Jesus, compreendemos que a Palavra de Deus é a luz dos olhos e luz para os olhos, como aliás, a Palavra divina define-se a si mesma (Sl 119,105). A Palavra de Deus é traduzida também como “mandamentos” dentro do mesmo contexto: “os mandamentos do Senhor iluminam os olhos” (Sl 19,9). É pelos mandamentos que conhecemos a vontade divina e entramos nos caminhos de Deus para viver fazendo a sua vontade.

            São esses “mandamentos” que abrem as portas das celebrações de setembro. Mandamentos não como código de proibições, mas como um caminho de vida, que conduz à serenidade e ao equilíbrio porque neles se encontra a vontade divina. De fato, para o homem e mulher religiosos os mandamentos não proíbem nada, juntos formam um caminho pelo qual é possível conhecer o modo como Deus pensa e, dessa forma, torna-se orientação para viver conforme a vontade divina (22DTCB). O acolhimento dos mandamentos, portanto, iluminam um modo de conhecer Deus, condição indispensável para que todo discípulo e discípula de Jesus se deixem iluminar pela luz divina.

            Além dos mandamentos, a Igreja propõe outros modos de conhecer Deus, consciente que tal conhecimento é sempre parcial, por mais que se aprofunde no Mistério insondável do divino. Um desses modos é criando intimidade existencial com Deus através da contemplação e da meditação. A dificuldade de tantas pessoas para meditar, o distanciamento cada vez mais visível da mística, a impossibilidade de silenciar para praticar a contemplação, devido ao barulho excessivo presente no mundo, e outros fatores mais, impedem o conhecimento profundo e pessoal de Deus (23DTCB). Impede, igualmente, o conhecimento de si mesmo enquanto imagem e semelhança de Deus. É a crise de identidade humana com relação ao divino. Em grande parte, isso se deve à carência de espiritualidade de nossos dias e à ausência de incentivo para cultivar a espiritualidade cristã. Ouve-se muito falar, na televisão e no rádio, por exemplo, de novenas e de orações, mas pouco, ou quase nada se vê propondo a espiritualidade como orientadora da vida. Isso dificulta o conhecimento mais aprofundado de Deus. É um dos desafios da nova evangelização: evangelizar a sociedade espiritualmente desanimada, surda e muda diante do Mistério de Deus. A profecia de Isaías e a cura do surdo-mudo provocam a nova evangelização a profetizar a libertação de isolamentos que impendem contemplar as obras divinas e impossibilita o conhecimento de Deus.

            O melhor modo para se conhecer Deus é conhecendo sempre mais Jesus. Se os dois primeiros conhecimentos aconteciam pelos mandamentos e pela meditação, agora o conhecimento acontece pela experiência de vida com Jesus, no discipulado. É assumindo os pensamentos de Jesus, aprendidos pelo seu seguimento, que nos aprofundamos no conhecimento de Deus. Para isso, não é suficiente aceitar Jesus como um grande homem religioso, mas como o Messias, o enviado de Deus que é a presença divina entre nós (24DTCB). Em tal processo de conhecimento entra-se na estrada do discipulado passando pela Cruz, não como dolorismo ou masoquismo, mas como espiritualidade de doação plena e radical. O conhecimento de Deus não acontece na lógica do pensamento humano, que considera o poder e a força, mas na forte debilidade da oblação existencial. É o paradoxo divino, que se faz forte através da fraqueza, que faz brotar a força da vida na aparente derrota da morte. O verdadeiro conhecimento de Deus, repetindo, acontece em Jesus, através da espiritualidade oblativa, cujo símbolo maior é a Cruz. A Cruz como altar, como local do sacrifício (sacrifício entendido como oferenda)

 

Relacionamentos que sejam fraternos

            Outro elemento que ilumina as celebrações de setembro, em nossas propostas celebrativas, são os relacionamentos cristãos nas diversas atividades sociais de nossas vidas. Inicialmente, percebe-se que existe uma diferença entre os interesses de Jesus e dos discípulos; uma contradição bastante acentuada (25DTCB). Enquanto Jesus prepara os discípulos para o Mistério Pascal, pela sua morte e ressurreição, aqueles estavam preocupados com o poder político; com relacionamentos de poder, que lhes desse destaque social. Viam a religião como possibilidade de projeção social e prestígio pessoal. O modo de relacionamento, contudo, para Jesus não está no poder político, mas no serviço que valoriza a vida humana de todos, a começar das crianças.

            Um assunto de grande importância conclui as celebrações dominicais de setembro, ainda no campo do relacionamento fraterno: a tolerância (26DCB). Um tema discutido na sociedade, embora pouco compreendido. Um tema defendido na Bíblia como importante e imprescindível para a convivência social, especialmente nesse tempo que assistimos e ouvimos tantos exemplos de intolerância religiosa contra os cristãos. Do ponto de vista religioso, a intolerância é uma atitude própria do fanatismo, de quem não é capaz de dialogar e acolher o outro porque é diferente, pensa diferente e professa uma fé diferente. Podemos discordar do diferente, como eles podem discordar de nós, mas sem perder a identidade e respeito pelo diferente. Buscar a tolerância é um modo de evangelizar, que condiz com o projeto da nova evangelização. Num mundo que prima pelo relativismo, a Igreja é convidada a propor o Evangelho como luz para se viver de modo equilibrado, respeitoso e fraterno.

Serginho Valle